quinta-feira, 28 de junho de 2012

A violência do poder público tem nome: omissão!


Por Luciana Rafagnin*

Os números são aliados da execução de políticas públicas. É para isso que servem os diagnósticos e estudos de caso; para nos fazer enxergar uma determinada situação e atuarmos no sentido de resolver o problema ou reforçar medidas eficazes já implantadas. Os números da violência contra a mulher no País e no Paraná são assustadores. Infelizmente, os dados da violência resultam de uma cultura machista e autoritária que só será vencida com muito investimento em educação e com forte compromisso institucional para banir da nossa sociedade tamanha barbaridade. O Mapa da Violência 2012, um estudo do Instituto Sangari para o Ministério da Justiça do Governo Federal, levantou e cruzou dados de fontes oficiais, como os do SUS, da OMS e do IBGE, a fim de montar um retrato da problemática. Em 30 anos, de 1980 a 2010, foram registrados 91.932 homicídios femininos para cada grupo de 100 mil mulheres e quase a metade (47%) deles ocorreram na última década. Foram 48.486 mortes entre 2000 e 2010.
Com base nesses dados, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Congresso Nacional, que investiga os crimes de violência contra a mulher em todo o País, realiza diligências e audiências públicas no Paraná nesses dias 24 e 25 de junho para não só levantar mais informações – uma vez que as fontes oficiais no estado praticamente não existem -, mas investigar a fundo o porquê de o Paraná ser o terceiro estado no ranking nacional de assassinatos de mulheres, com 388 homicídios femininos registrados em 2010 e um índice de 6,3 mortes por ano para cada grupo de 100 mil mulheres. A média nacional é de 4,4 e coloca o País em sétimo lugar no ranking mundial. Piraquara, na região metropolitana de Curitiba, tem índice alarmante de 24,4 mortes para cada grupo de 100 mil mulheres. Cinco vezes acima da média nacional e três vezes superior ao drama paranaense. Araucária, Fazenda Rio Grande, Telêmaco Borba e União da Vitória também se destacam no Mapa da Violência contra a mulher. E esse perigo mora dentro de casa: cerca de 70% dos homicídios são praticados pelos maridos, ex-maridos e namorados das vítimas.

(*) Luciana Rafagnin é deputada estadual e líder da bancada do PT na Assembleia Legislativa do Paraná. Este artigo foi publicado na edição do Jornal de Beltrão de sábado (23/06/2012) - Página 7C - Geral.


A rádio CBN de Cascavel levantou esta semana, junto à Delegacia da Mulher da cidade, alguns indicadores: em 2011, foram abertos 206 inquéritos por violência doméstica e 52 mulheres foram encaminhadas ao abrigo local, onde permanecem por três meses. De janeiro a maio de 2012, foram 128 inquéritos por violência doméstica e 22 mulheres encaminhadas para o abrigo. Isso também significou uma média de 15 medidas protetivas adotadas por mês. Já a média mensal de boletins de ocorrência policial (B.Os.) por violência doméstica em Cascavel se manteve no mesmo patamar do ano passado, ou seja, 164. Dados como esses são raros de se obter no estado, assim como questionamos a falta de instrumentos de prevenção da violência e de proteção às mulheres. No Paraná, denuncia o Dr. Rosinha (PT), existe apenas uma casa abrigo mantida pelo estado. Rosane Ferreira (PV), quando parlamentar estadual em 2009, apresentou projeto de lei para garantir o tratamento e a recuperação também dos agressores, que na maioria das vezes são portadores de problemas emocionais, psíquicos e dependentes do álcool e de drogas. Se a causa da agressão não for atacada, as chances são de que ele volte a praticar o crime e a fazer outras mulheres vítimas das agressões.


A CPMI vai analisar ainda se há omissão do poder público para que se chegue a esse absurdo. Quais medidas estão sendo tomadas por municípios e pelo estado e de que estruturas as paranaenses dispõem para combater e se defender dessa brutalidade. O serviço de atendimento Ligue 180, da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República, que funciona 24h por dia, inclusive nos domingos e feriados, a fim de atender denúncias e prestar orientações às mulheres vítimas de violência, é mais um indicador, embora só registre as procuras realizadas. Então, é um número que se tem da realidade, pautado apenas nas denúncias que chegam, ou seja, a violência é percebida quando se denuncia ou onde se coletam os dados. Não significa necessariamente que ela não aconteça em outros locais que não se destacam nos diagnósticos. Grande parte das agressões as mulheres ainda sofrem caladas e em casa. A falta de delegacias especializadas e de pessoal capacitado para prestar um atendimento com qualidade nas unidades de saúde e nas instâncias policiais e do sistema judiciário, que realmente amparem as mulheres agredidas, apesar de todo suporte legal conferido pela Lei Maria da Penha, ainda inibe elas a se defenderem sob a proteção de escudo institucional. Em 2008, estudos da Fundação Perseu Abramo já revelavam também que a cada 15 segundos uma mulher é espancada no país. O governo federal já arregaçou as mangas e coordena as ações do Pacto Nacional de Enfrentamento da Violência Contra a Mulher.


Como parlamentar e mulher, me encontro indignada e triste diante dessa crueldade cultural e social que é a violência. Mas é por isso que não podemos nos abater e que sempre me coloco como parceira dos movimentos sociais e feministas e das organizações de mulheres que defendem a criação da secretaria estadual da mulher no Paraná. Sem esse forte instrumento e sem orçamento específico para desenvolver ações e projetos eficazes, esses números continuarão surpreendendo e agredindo mais uma vez cada cidadã e cada cidadão do nosso estado. Porque a violência do poder público tem um nome: é omissão!
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(*) Luciana Rafagnin é deputada estadual e líder da bancada do PT na Assembleia Legislativa do Paraná. Este artigo foi publicado na edição do Jornal de Beltrão de sábado (23/06/2012) - Página 7C - Geral.

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